*Em meio à crescente incerteza e às mudanças nas políticas comerciais nos mercados transatlânticos, um número crescente de empresas alemãs está migrando para a China, atraídas pela estabilidade regulatória e perspectivas de crescimento mais claras.
*Por meio da produção local, parcerias tecnológicas e investimentos direcionados, as montadoras buscam fortalecer sua posição na Ásia e acelerar a transformação estrutural.
Berlim, 10 ago (Xinhua) -- Desde abril, um forte aumento nas tarifas dos EUA sobre veículos fabricados na UE tem sido um duro golpe para a indústria automobilística europeia, causando quedas acentuadas nos lucros das maiores montadoras alemãs e fazendo com que elas busquem oportunidades na Ásia.
Um acordo recente entre a UE e os Estados Unidos reduziu a alíquota tarifária de 25% para 15%, aliviando as tensões imediatas. Mas especialistas alertam que o adiamento pode ser de curta duração, já que os altos custos de exportação e a persistente incerteza política continuam pesando sobre o setor manufatureiro alemão e diminuindo a confiança da indústria.
CHOQUE TARIFÁRIO REDUZ LUCROS
BMW, Mercedes-Benz e Volkswagen, as três maiores montadoras da Alemanha, relataram fortes quedas nos lucros no primeiro semestre de 2025, citando as tarifas americanas como um grande entrave aos lucros.
A BMW afirmou que a receita do grupo caiu 8,2% na comparação anual, enquanto o lucro líquido recuou 29%. A empresa apontou as tarifas elevadas como fator-chave para as margens mais fracas em seu principal negócio automotivo. A Mercedes-Benz viu seu lucro líquido cair de cerca de 6,1 bilhões de euros (7,08 bilhões de dólares americanos) no ano passado para aproximadamente 2,7 bilhões de euros (US$ 3,15 bilhões).
Foto mostra estande da montadora alemã Mercedes-Benz no Salão do Automóvel de Cingapura, realizado no Centro de Convenções e Exposições Suntec Singapore, em Cingapura, em 9 de janeiro de 2025. (Xinhua/Then Chih Wey)
O Grupo Volkswagen relatou uma margem de queda de 0,3% na receita de vendas. Sua marca premium, Porsche, foi particularmente afetada, incorrendo em cerca de 400 milhões de euros (466 milhões de dólares) em custos adicionais relacionados a tarifas somente no primeiro semestre.
O fluxo de caixa também está sob pressão. De acordo com o jornal inglês Financial Times, o fluxo de caixa livre combinado das três empresas pode encolher em até 10 bilhões de euros (11,65 bilhões de dólares) este ano, com custos tarifários e turbulências econômicas mais amplas influenciando.
Apesar do último corte tarifário, o sentimento em todo o setor permanece contido. Várias empresas já revisaram para baixo suas projeções para 2025. Hildegard Mueller, presidente da Associação Alemã da Indústria Automotiva (VDA), afirmou que a taxa mais baixa ainda deixa as montadoras com bilhões de euros em custos adicionais por ano, um fardo pesado enquanto elas passam por uma transição essencial para a eletrificação.
Sigrid de Vries, diretora-geral da Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis, alertou que as tarifas americanas elevadas e contínuas sobre veículos e peças correm o risco de reduzir a competitividade global da indústria da UE, interrompendo as cadeias de suprimentos americanas e prejudicando os consumidores.
DESAFIOS ESTRUTURAIS PROFUNDOS
A queda nos lucros enfrentados pelas montadoras alemãs decorre não apenas de choques tarifários de curto prazo, mas também de um conjunto mais amplo de desafios estruturais.
As tarifas americanas estão se espalhando pela cadeia de suprimentos. Com os Estados Unidos impondo tarifas de 50% sobre aço, alumínio e outros materiais importados, os fornecedores a montante estão repassando os custos crescentes para os fabricantes, comprimindo ainda mais as margens já apertadas.
Segundo a VDA, a Alemanha exportou cerca de 450.000 veículos para os Estados Unidos em 2024. No mesmo período, as montadoras alemãs produziram mais de 840.000 veículos em suas instalações nos EUA, dos quais cerca de metade foram exportados globalmente. Esse modelo de produção transfronteiriça é especialmente vulnerável a mudanças abruptas nas políticas.
O CEO da Volkswagen, Oliver Blume, afirmou que as fábricas do grupo nos EUA foram fortemente afetadas pelos aumentos de tarifas, gerando custos adicionais de 1,3 bilhão de euros (1,51 bilhão de dólares) somente no primeiro semestre. Juergen Rittersberger, diretor financeiro da Audi, estimou os prejuízos da marca em cerca de 600 milhões de euros (699 milhões de dólares) devido às tarifas.
Visitantes observam carros da Volkswagen na 21ª edição do Salão Internacional do Automóvel de Shanghai, em Shanghai, leste da China, em 1º de maio de 2025. (Xinhua/Fang Zhe)
Desde o início de 2024, diversas montadoras e fornecedores, incluindo Ford, Stellantis, Volkswagen, ZF e Bosch, anunciaram demissões ou fechamentos de fábricas na Alemanha e em outros países europeus.
A redução da carteira de pedidos e o aumento dos custos de energia e mão de obra estão minando a competitividade industrial da região. Ao mesmo tempo, as montadoras alemãs continuam atrás de suas rivais americanas e chinesas na corrida pela eletrificação.
BUSCA DE OPORTUNIDADES NO LESTE
Em meio à crescente incerteza e às mudanças nas políticas comerciais nos mercados transatlânticos, um número crescente de empresas alemãs está se voltando para a China, atraídas por sua estabilidade regulatória e perspectivas de crescimento mais claras. Por meio da produção local, parcerias tecnológicas e investimentos direcionados, as montadoras buscam fortalecer sua posição na Ásia e acelerar a transformação estrutural.
Arno Antlitz, diretor financeiro e diretor de operações da Volkswagen, expressou recentemente forte confiança na expansão de plataformas locais e parcerias com baterias no mercado chinês.
A BMW também anunciou uma colaboração com a empresa de tecnologia chinesa Momenta para o desenvolvimento conjunto de sistemas de assistência ao motorista de última geração, adaptados aos consumidores locais.
Foto tirada em 8 de maio de 2024 mostra cerimônia de lançamento do 6.000.000º carro produzido pela BMW Brilliance Automotive (BBA) em Shenyang, província de Liaoning, nordeste da China. (Xinhua/Pan Yulong)
"Esta colaboração poderosa, com a sabedoria da China, sustenta a estratégia da BMW de ‘Na China, para a China e criação conjunta na velocidade da China’, elevando-a a novos patamares", disse Sean Green, presidente e CEO do BMW Group Região China, enfatizando a importância de usar forças complementares e inovação conjunta para alcançar um progresso revolucionário.
"O futuro da indústria automobilística está na China", disse Ferdinand Dudenhoeffer, renomado especialista automotivo alemão. Ele defendeu a expansão da cooperação entre empresas alemãs e chinesas em todo o cenário de veículos e cadeias de suprimentos.
A BMW e a Porsche oferecem vantagens em desempenho, enquanto a Mercedes-Benz lidera em design e conforto, e todas as três estão cada vez mais contando com a vantagem da China em tecnologia de baterias e produção em escala para se manterem competitivas, disse Dudenhoeffer.
Como o recente acordo tarifário entre EUA e UE cria muita incerteza para as empresas, Michael Schumann, presidente da Associação Federal Alemã para o Desenvolvimento Econômico e Comércio Exterior, alertou que o sistema comercial global está sob crescente pressão, com o comércio sendo cada vez mais usado como ferramenta geopolítica.
Em um cenário global fragmentado, a China pode representar um dos pilares da estabilidade regulatória para empresas internacionais, afirmou ele.